sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Crise de água em São Paulo pode ser “ponta do iceberg” de crise nacional (e também uma ótima oportunidade para pensarmos em gestão)

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Faltam investimentos, mas oportunidade para cobranças é ótima: especialista em recursos hídricos explica como chegamos até aqui e o que sociedade e governo devem fazer para evitar uma catástrofe regional de abastecimento

Não precisa morar em São Paulo, basta ter lido alguma notícia sobre a cidade nos últimos meses para ter encontrado a expressão “crise da água” escrita em algum lugar. A metrópole passa, às vésperas das eleições, por uma situação delicada. O chamado “volume morto” do Sistema Cantareira já está em uso e a Sabesp estuda utilizar um nível ainda mais profundo de suas águas. O mesmo deve ser feito com o Alto Tietê. Cachoeiras estão secando e o nível de alguns rios está baixando. Apesar da negativa de racionamento do governo estadual, falta água com frequência para parte dos moradores da região metropolitana. Por causa disso, empresas reduziram suas atividades e, segundo a Fiesp, 3 mil demissões já ocorreram apenas em São Paulo.

As imagens da TV Folha ilustram bem a situação.

Estudo da Agência Nacional de Águas ponta que essa situação poderia ter sido evitada se, nos últimos quatro anos, R$ 22 bilhões tivessem sido investidos em abastecimento – valor semelhante ao gasto com a Copa do Mundo. A situação é de crise, mas também de oportunidade. Exemplos dentro e fora do Brasil mostram possíveis caminhos. Mas todos têm que agir.

“O Sistema Cantareira pode ser só a ponta de um enorme iceberg chamado crise de água no Brasil. Os demais estados do Sudeste caminham para o mesmo destino. E a ‘culpa’ é de todos: da estiagem, do consumo e, principalmente, da gestão”. Quem afirma isso é Glauco Kimura de Freitas, biólogo e especialista em recursos hídricos da WWF-Brasil.

Kimura explica que o tripé estiagem, consumo e gestão é o grande responsável pela crise. Mesmo assim, e apesar da falta de chuvas, a ação humana tem peso grande. Para ele, a população não tem consciência do uso cotidiano da água. “Quase tudo que fazemos envolve água”, conta. “Uma xícara de café que você toma na padaria precisou de água para ser feita. Mas ninguém pensa nisso.”

Segundo uma pesquisa realizada pela WWF em parceria com o Ibope, 82% dos brasileiros acreditam que o Brasil terá problemas com falta de água no futuro e 70% reconhecem que desperdício, consumo exagerado e poluição são os motivos. Mas 60% confessam ter pouco controle sobre os gastos e 84% nunca ouviram falar dos Comitês de Bacia.

domínio público
domínio público

O reservatório Paulo de Paiva Castro, em Mairiporã, faz parte do Sistema Cantareira, que se encontra atualmente em um estado bem diferente do da foto.

A falta de atenção ao tema, na opinião do especialista, se reflete na falta de ações dos governantes. O Governo do Estado afirmou em várias declarações ao longo do ano que o período anormal de estiagem, e não a gestão, deveria ser culpado pela crise. A Sabesp diz, em nota, que “estamos enfrentando a maior período de falta de chuvas registrada nos últimos 84 anos” e que “não há rodízio, racionamento nem restrição de consumo em nenhum dos 364 municípios atendidos pela empresa”.

“O Brasil sempre foi um privilegiado, mas assim como dinheiro, não se pode gastar toda a água que você tem sem pensar no futuro”, explica Kimura. “Nós temos uma das melhores legislações do mundo quanto ao tema, com a Política Nacional de Recursos Hídricos, mas ela não é utilizada da forma correta.”

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